Pular para o conteúdo principal

A DOR DO OUTRO

Por Sibéria de Menezes

É comum afirmar que a grama do vizinho é sempre mais verde. Aí o outro é paragem e delícia. Mas há um outro. Outro que ignoramos, outro a quem queremos ainda mais mal. O outro por quem não nos compadecemos. Por quem não exercemos compaixão: aquele que sofre. Aquele que carrega uma dor. Porque a dor do outro não é desejada como é a grama do outro. Porque a dor é um substantivo abstrato. Porque precisamos sentir para saber dimensionar a dor.

Para quem já sentiu uma dor, qualquer delas, talvez seja um pouco mais fácil colocar-se no lugar do outro. Há, porém, o esquecimento da dor. Há quem mesmo tendo passado por experiência semelhante a do outro, ainda o julgue, ainda ridicularize a dor pela qual o outro passa.

(Com)paixão, capacidade de sofrer a dor do outro, dimensionar a dor do outro, entender que o outro precisa de suporte. É mais que o ato de (com)padecer-se do outro, porque a compaixão deve ir além do lamento e da contemplação da dor alheia.

Cristo pregou em todos os atos da sua vida a compaixão. Ele esteve entre nós pecadores, vivendo como se fosse uma pessoa comum, entendendo sempre a dor do outro, e, ao mesmo tempo, encorajando-o para a libertação da dor, qual fosse: dor espiritual, física, emocional, social.

Por que é tão difícil desenvolver compaixão? Porque a dor do outro é a dor do outro. Quando são nossas as dores, são outros quinhentos. Porque quando são nossas sentimos profunda, violentamente. Porque quando são alheias a culpa é sempre de quem as tem. Porque foi ele (o outro) quem as procurou e agora as desfrute. Bem, mas, conosco? E as nossas dores? Bem, aí queremos compaixão. Aí queremos compreensão. Aí queremos ouvir um: “Eu entendo”. E esta sentença já nos fortalece um pouco, já nos iça para fora do buraco da dor.

É preciso que sejamos compassivos com o outro. E aquele que menos ignorar, na medida do que sabe, tente compadecer-se do que mais ignorar, do que menos souber, e tente, por palavras e atitudes, diminuir a distância que separa o que sofre do que não sofre, em dado momento. Porque todos iremos sofrer, todos iremos ter o coração, em algum momento, flagelado pela dor.

Então, faço um convite (que também é a mim mesma), de exercitar a compaixão pelo nosso próximo, de tentar compreendê-lo num momento de fragilidade, de sofrimento, de dor. Porque a dor dividida é dor diminuída. Que sejamos um alento na hora de dificuldade de nossos irmãos. Que saibamos partilhar de momentos de alegria, e também saibamos, de alguma forma, digerir a dor com o outro. 

Comentários

  1. ... porque devemos ir além do lamentar e da simples contemplação da dor alheia ...simples assim ... (y)

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. a "consciência" é a Lei Divina dentro da gente. receberei amanhã. o que planto no presente... se você quer progredir. Faço o bem urgetemente

      Excluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

LIVRANDO-SE DE CALCINHAS-UM-POUCO-VELHAS

LIVRANDO-SE DE CALCINHAS “UM POUCO VELHAS” “Sujo atrás da orelha, Bigode de groselha, Calcinha um pouco velha Ela não tem” (Chico Buarque/Edu Lobo. Ciranda da Bailarina) A partir desses versinhos, lindamente interpretados por Adriana Partimpim (heterônimo da Adriana Calcanhoto para crianças), surgiu, numa roda de meninas-não-bailarinas, onde, felizmente, eu estava, um assunto que me chamou atenção. “Isto merece um texto!”. Ei-lo! A pergunta é a seguinte: o que fazer com calcinhas velhas? Daquelas mesmo que estás pensando nessa sua cabecinha, aquelas... que todas nós tivemos, temos e teremos, em algum momento da vida – se Deus quiser! Calcinhas um pouco velhas sempre estarão nas nossas gavetas. E como teremos rituais e alguma dificuldade para jogá-las fora! Conversa vai, conversa vem... fui ouvindo depoimentos tão curiosos que me arrepiei ao pensar no quanto estávamos desfrutando de tamanha intimidade naquele momento. Eu também tive a minha hora de confessar o que costumava fazer com ...

A palavra Mãe

Mãe, palavra que cria o mundo. Mãe é o substantivo mais adjetivo que existe.   A palavra mãe simboliza um algo a mais, incabível no nome em si, por isso, para mim, pertence a duas classes gramaticais – é substantivo e adjetivo. Mãe, adjetivo, é palavra que qualifica o ser. Quando digo e ouço “mãe” toda a ternura do mundo vem a minha boca, entra pelos meus ouvidos. Parece um abraço caloroso e mãos leves. Mãe pode significar carinho, saudade, zelo; também como para mim significa carinhosa, saudosa, zelosa... o nome e o adjetivo cuidam em estar tão juntos de nunca se soltarem. Mãe é uma lente de aumento. Intuitivamente, as mães estão sempre um passo a frente dos filhos; mãe é mãe mesmo quando não dá à luz um ser; assim ela muda a construção da regência para dar luz a um ser – mãe é luz. Generosa, dá luz e dá à luz. Mãe é coisa de Deus. Mulher nasce com a marca de ser mãe, é visceral, e, quando o ventre não conjuga o verbo gerar, a mulher, facilmente, torna-se mãe da mãe, d...

Corpo Alvejado

Quando uma flecha perfura um corpo Provoca duas dores: Uma quando atinge a carne, Outra quando retirada dela No intervalo das duas dores Há o silêncio daquilo que sangra Feito de agonia e medo Para sobreviver É necessário retirar a flecha Mesmo que doa Mesmo que sangre Mesmo que isso não seja garantia de vida Destaca a flecha Mune-te de coragem Atende ao instinto de viver Retira a flecha Que te paralisa Que te sufoca Que te faz temer os seus próprios movimentos Livra-te da agonia de viver entre quase-vivo e quase-morto Retira a flecha Cravada desde tanto tempo contra ti Não seja o corpo da flecha Não seja o corpo onde mora a flecha Seja teu próprio corpo Sem flecha Sem a dor do medo Coragem! Retira a flecha (CORPO ALVEJADO. Sibéria de Menezes) ❤📝 #LuzSobrePoesia #CorpoAlvejado #RetiraAFlecha #EndurecerSemPerderATernura