Pular para o conteúdo principal

Minha desordem mental

Minha cabeça não é muito boa. Ela me engana a qualquer deslize, a qualquer tempo em que preciso de juízo. Minha cabeça me faz passar vexames por não dar conta de que dia ou hora é hoje ou ontem ou amanhã. Ela não está preparada, e talvez nunca estará, para a vida prática, de ajuntamentos de informações e dados ou datas, sempre elas, as datas... a se desencontrar de mim. Nela, na minha cabeça, esqueci (ou esqueceram, não sei) de marcar os dias das coisas e, assim, me esforço quase heroicamente para responder que dia é hoje? Quando é tal dia? Quando foi o último feriado? Quando... quando... quando... é tanto quando interrogado na minha vida, que me dá uma agonia. Eu vivo num branco, aonde minha cabeça me levou e leva. Sem saber me preocupar que dia será o fim do mês, do gás, da luz, da água ou do telefone. Sou uma irresponsável sem causa e sem chance de cura, mas com sofrimento. Eu sofro quando a enxurrada me atinge em cheio, impiedosa vida que me cobra o que minha mente não alcança. Minha cabeça brigou com meu coração. E meu corpo só atende à (des)razão  da minha desordem mental. Minhas pernas e braços não atendem meu coração que quer cuidar, que quer ir aonde sou chamada a estar. Um dia achará minha cabeça a corresponder os (des)mandos do meu coração? E ordenará ao meu corpo inteiro a saber que dia é hoje? Que hoje é dia de vacinar Dora. Que hoje é dia de pagar o telefone. Que hoje é dia de matricular as crianças. Que hoje é dia de levar a câmera do conserto. Que hoje é dia de estar pronta às 6:30 e de ir não sei para onde, para o raio que me parta, mas para algum lugar que já agora minha cabeça não me permite saber... Hoje é dia de lavar as fardas das crianças, de comprar suas frutas, de fazer planos e depois, fatalmente, esquecê-los todos e deixar todos para outro dia, que fogem ao calendário racional, que se junta a tantos outros pontos de interrogação pela vida futura e incerta. Sim, mas que dia é hoje mesmo?

Comentários

  1. Ih, amiga, se há sofrimento na desordem mental, e digo de cátedra, que também há no excesso de ordem da mente que sabe o dia e a hora pra tudo, e que quer comandar e atender a todos esses mandados.
    Acho que o desmando determina mais leveza, continue assim: leve.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Obrigada, Amanda. Você é uma amiga muito atenciosa e dedicada, com desordem ou com ordem, amo-te muito!

      Excluir
  2. Muito bom texto, li várias vezes ;]

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

LIVRANDO-SE DE CALCINHAS-UM-POUCO-VELHAS

LIVRANDO-SE DE CALCINHAS “UM POUCO VELHAS” “Sujo atrás da orelha, Bigode de groselha, Calcinha um pouco velha Ela não tem” (Chico Buarque/Edu Lobo. Ciranda da Bailarina) A partir desses versinhos, lindamente interpretados por Adriana Partimpim (heterônimo da Adriana Calcanhoto para crianças), surgiu, numa roda de meninas-não-bailarinas, onde, felizmente, eu estava, um assunto que me chamou atenção. “Isto merece um texto!”. Ei-lo! A pergunta é a seguinte: o que fazer com calcinhas velhas? Daquelas mesmo que estás pensando nessa sua cabecinha, aquelas... que todas nós tivemos, temos e teremos, em algum momento da vida – se Deus quiser! Calcinhas um pouco velhas sempre estarão nas nossas gavetas. E como teremos rituais e alguma dificuldade para jogá-las fora! Conversa vai, conversa vem... fui ouvindo depoimentos tão curiosos que me arrepiei ao pensar no quanto estávamos desfrutando de tamanha intimidade naquele momento. Eu também tive a minha hora de confessar o que costumava fazer com ...

Detonando em 3, 2, 1...

Por Sibéria de Menezes Explosão é multiplicação, é divisão. Explodir é extremamente necessário e vital. Dizem que o mundo, este mundo, nasceu de uma explosão. E o que somos nós, senão uma explosão ambulante? É preciso arranjar uma forma de explodir – de amor, de ódio, de tesão, de ternura, de revolta, de literatura. Explodir é não caber mais em si, é não se rodear pelas mesmas margens e definir um novo contorno, borrado ainda pela “imatureza”. Quer saber? Exploda-se! Multiplique-se em mil pedacinhos, estraçalhe-se, divida-se e, recomponha-se, arranje outro jeito de estar aqui, sente-se do lado oposto, ouça uma nova canção, reinvente-se para encher-se de outras certezas e, quando não couber mais andar com elas... saiba – é tempo de uma nova explosão. Corte os cabelos, jogue-os para o outro lado, tome o ônibus errado de propósito, diga que hoje NÃO ou diga que hoje SIM. Derive-se. Crie-se. Conjugue-se. Exploda. Ouço o barulho ao redor. Está tudo a explodir a todo in...

A palavra Mãe

Mãe, palavra que cria o mundo. Mãe é o substantivo mais adjetivo que existe.   A palavra mãe simboliza um algo a mais, incabível no nome em si, por isso, para mim, pertence a duas classes gramaticais – é substantivo e adjetivo. Mãe, adjetivo, é palavra que qualifica o ser. Quando digo e ouço “mãe” toda a ternura do mundo vem a minha boca, entra pelos meus ouvidos. Parece um abraço caloroso e mãos leves. Mãe pode significar carinho, saudade, zelo; também como para mim significa carinhosa, saudosa, zelosa... o nome e o adjetivo cuidam em estar tão juntos de nunca se soltarem. Mãe é uma lente de aumento. Intuitivamente, as mães estão sempre um passo a frente dos filhos; mãe é mãe mesmo quando não dá à luz um ser; assim ela muda a construção da regência para dar luz a um ser – mãe é luz. Generosa, dá luz e dá à luz. Mãe é coisa de Deus. Mulher nasce com a marca de ser mãe, é visceral, e, quando o ventre não conjuga o verbo gerar, a mulher, facilmente, torna-se mãe da mãe, d...