Porque há várias árvores na nossa estrada...
Na escola onde eu trabalho há uma imensa árvore no quintal. Um
pé de timbaúba. É outono e recebi uma chuva de folhas de presente dessa árvore.
Que sensação deliciosa em todos os meus sentidos! Folhas miúdas rezavam graciosamente
sobre a minha pele me protegendo de todos os perigos dessa vida. Por mais que
aproveitasse o momento, e talvez por isso, não pude pensar o que me levou a
sentir de maneira tão intensa aquela chuva.
Passaram-se alguns dias e, de súbito, fui pega pela imagem
relampejante das árvores da minha vida. Da infância, da mais precoce delas. Do
pote de lembranças que muitas vezes me pergunto se é imaginação ou realidade,
eis que me aparecem três árvores. A primeira, um pé de coco no quintal, depois
dos três degraus da cozinha, ao lado da lavanderia. A segunda, um pé de oiti
que não vimos crescer até o seu limite, que ficava em frente a minha casa, do
outro lado da rua. A terceira, um pé de castanhola – alguém lembra o que é um
pé de castanhola? Esse ficava na calçada de doutor Bode, recebendo quem vinha
da rua debaixo, chegando-se a nossa rua. Era um triângulo perfeito, formado por
três árvores, que, em diferentes tempos acompanharam a história de três meninas
– minhas duas irmãs e eu.
Nosso imaginário está cheio de árvores – da Vida, do
Conhecimento, a simbologia de algumas árvores, como a oliveira, que alguns
crêem, representa o próprio Deus. Só para citar algumas. Há também o dizer de
que o homem deve plantar uma árvore, escrever um livro e ter um filho. Bom, o
fato é que de mais a mais deixamos passar em branco as árvores ao nosso redor,
como se transparentes fossem. E a verdade é que as árvores , essas árvores das
quais lembro nesse instante, protegiam-me da vida cinza e me alegraram de
formas diferentes.
O pé de coco fez muita gente rir, quando eu ainda aprendendo
a falar dizia que na minha casa tinha um pé jicoco e, quando comecei a
escrever, escrevia pé ji coco. O pé de coco foi um dos motivos de escrita na
minha primeira escola. De qualquer forma, eu sentia-me muito feliz pela
presença dele no minúsculo quintal. Um alívio para a vista, um verde que
refrescava como a água que ele produzia.
O pé de castanhola, com suas folhas grandes, rendia
brincadeiras com a meninada da rua. A gente brincava com folhas, imaginando
para elas outras coisas: toalha de boneca, chapéu de marinheiro, leques
finíssimos, roupa da cama da boneca. Era muita criatividade no ar! E tinha
mais: comíamos castanholas escondidos, porque os pais diziam que era quente,
que “ofendia”. Uma beleza! Não sei se eram bons pelo gosto ou pela
transgressão. Mas a lembrança que tenho é deliciosa. Tem gosto de gente
pequena, sem juízo e sem medo.
O pé de oiti, justamente o que ficava bem em frente a minha
casa, do lado oposto, foi uma causa de muita disputa de vizinhança. Meu pai
plantou a tal árvore, depois mudou-se para lá outro vizinho e queria porque
queria até enfim conseguir matar a pobre planta. Meu pai morreu de desgosto. Afinal,
ela era cria dele, não deixava de ser. Mas já era grande, não imenso, como
naturalmente são. Porém, sua sombra era imensa. E jamais a bela promessa de
árvore deu frutos.
A primeira e a última citadas não tiveram vida longa. Mas duraram
toda a minha infância. A segunda ainda hoje está lá, firme, forte e cheia de
memória! Nem sei dizer se as crianças que lá vivem querem saber e provar o “tal
fruto proibido”. Quem sabe? Sei, se é que existem coincidências, que enquanto
morávamos nós três lá, as três árvores estavam de pé e agora são apenas uma
amorosa lembrança.
Nos acompanham hoje árvores diferentes, testemunhando nossas
crianças que crescem, cheias de vida e imaginação. Árvores que testemunham
nossa vida adulta e, por que não dizer, de descobertas?
A árvore do quintal chove. E meus olhos também. Agradeço por
ter em meu favor e caminhos árvores sempre. Gentis, generosas, que me dão
sombra, oxigênio e, muitas vezes fruto, sem me perguntar quem sou.
Lindo, Sibéria... parece que estou lendo Rubens Alves...
ResponderExcluirPosso ler para meus alunos em sala de aula?
Claro, Paula! E muito agradeço pelo seu comentário. Beijo
ExcluirClaro, Paula! E muito agradeço pelo seu comentário. Beijo
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