Cada dia tem sido mais difícil escrever alguma coisa no blog. Alguém deve ter reparado. Não. Não é falta de tempo, muito menos de palavras. Eu pensei em deixar de escrever aqui, talvez eu o faça com o passar do tempo. E se até agora eu escrevi é porque a escrita é o que me pega e faz de mim o que quer e também porque sempre adorei diário. Só há um detalhe: o diário era meu. Só meu. E não o que hoje tentamos fazer - Blog, blogar, essa linguagem toda nova. Ai, me senti agora com oitenta anos! Sim, já passaram alguns anos que fui adolescente. Não vou fingir que entrei nessa de blog sem saber, pelo contrário: a minha autoproposta era conseguir me mostrar - o que tem sido a minha vida inteira meu "calcanhar de Aquiles". O que mais me agradou na ideia do blog foi o fato de que as pessoas que o lessem seriam pessoas desconhecidas (presencialmente falando), o que tiraria bastante carga do teor "diário" desta escrita. Mas a verdade, depois dessa fase de tamanha tentativa de superação, é que não consigo ultrapassar a borda que me separa do outro. Algumas vezes acho que isso foi possível, poucas como agora, que escrevo essas linhas de confissão. O que tenho observado nessas mídias todas "blog", "orkut", "sites" é que o teor diário é o que menos aparece. E o que é um "diário" para mim? É um espaço onde eu posso ser eu mesma. Isso é engraçado! É um lugar, que, você escreve para você mesmo e, portanto, pode usar de toda a sinceridade e nudez possível - e é aí que falham (para mim) as mídias citadas: as pessoas escrevem de si para os outros. Não para os outros como destinatários, mas para que os outros concebam algo de quem escreve como sendo a mais pura verdade. Então: eu publico no meu blog o que eu quero que os outros saibam de mim. Autossabotagem ou não - eu não sei publicar só aquilo que fará de mim uma boa imagem, ou então eu não tenho essa autoimagem tão boa assim prá publicar, ou minha autocrítica é muito exigente. Bem, textos longos cansam. Eu canso. E o pior é que só sei ser longa no dizer. Quem se importa? Talvez umas imagens bonitas chamassem atenção. Talvez um texto heróico. Ou talvez eu tivesse outro nome e escrevesse para revistas famosas, ou talvez eu estivesse na rede globo ou recebesse um oscar, ou um nobel... talvez isso que eu digo fosse importante para alguém além de mim mesma. Mas, na verdade, se eu fosse Álvaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa, eu escreveria de novo o texto abaixo:
POEMA EM LINHA RETA
Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.
Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...
Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,
Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?
Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?
Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.
Eu sei, eu posso escrever o que quiser aqui. Mas não quero me mostrar mais do que isso. Ainda não. E talvez em nenhum dia. Mas se o leitor quiser, fique à vontade. Mania de professora, vai aí uma questão: Você já levou porrada ou é também um semideus? Não entenda minha provocação como uma ofensa. Eu quero só alguns comentários engraçados.
Beijo
POEMA EM LINHA RETA
Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.
Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...
Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,
Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?
Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?
Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.
Eu sei, eu posso escrever o que quiser aqui. Mas não quero me mostrar mais do que isso. Ainda não. E talvez em nenhum dia. Mas se o leitor quiser, fique à vontade. Mania de professora, vai aí uma questão: Você já levou porrada ou é também um semideus? Não entenda minha provocação como uma ofensa. Eu quero só alguns comentários engraçados.
Beijo
Oi querida! Eu penso que ninguém fica tão "NU" assim nesses diários virtuais. Obviamente a gente até tenta ser o mais honesta possível, mas na verdade mostramos apenas aquilo que queremos ou podemos mostrar. E ainda que haja aqueles que não se importem em mostrar seus lados mais obscuros, todos tendemos mostrar o que é há de mais bonito em nós, sei lá... precisamos de aceitações. E esse texto de Pessoa ilustra bem isso, né?
ResponderExcluirBjs e continue a escrever, moça! Vc é boa nisso!